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10/01/2023 00:00
Resumo da ópera (ou como chegamos onde chegamos):
Por Paulo Roberto de Almeida **
Não era para o setor direitista da sociedade - que sempre existiu de forma dispersa - ter chegado ao extremo da contestação do sistema democrático; nunca o fez depois do restabelecimento da democracia ao final da mais longa ditadura já conhecida na história do Brasil e a única exclusivamente militar (o Estado Novo teve o pleno apoio da corporação, mas não foi uma ditadura militar no sentido estrito do termo).
Pois bem: os oficiais militares, irritados com os trabalhos da Comissão Nacional da Verdade, que atribuiu acertadamente os crimes cometidos pelo Estado entre 1964 e 1985 à corporação essencialmente, mas que deixou de lado os crimes cometidos pela oposição armada, resolveram aplicar um corretivo aos esquerdistas e aos civis em geral, se achando ainda, de forma completamente arrogante, uma espécie de poder moderador, numa conjuntura de crise politica e econômica no país e de divisão da sociedade entre grupos pró e antipetistas.
Só que escolheram o instrumento errado e o mais inepto possível: um militar de baixa patente, medíocre na carreira e na política, outrora desprezado pela corporação, mas que lhes pareceu poder ser manipulado à vontade para satisfazer seus desejos de vingança e, ao mesmo tempo, servir a seus interesses pecuniários.
Nasceu aí o projeto que desaguaria no mais horrendo governo de toda a história do Brasil, e isso desde o primeiro governador-geral, D. Tomé de Souza, em 1549.
A direita dispersa não se congregaria da forma como o fez sem o estímulo, o aval e a ativa colaboração da oficialidade militar.
A partir daí, oficiais militares de alto e de baixo coturno começaram a se lambuzar no leite condensado do bolsonarismo fascistoide, flertaram com o golpe, não por ideologia, mas por prebendas máximas, e perderam o respeito da cidadania esclarecida, porque extorquiram o orçamento público com apoio do inepto boçal. Não tinham coragem, nem liderança e nem unidade para um golpe no estilo clássico, por isso apoiaram civis e militares de baixa extração no trabalho sujo de dar continuidade ao desgoverno confuso e desorganizado do inepto boçal.
Este é o fato singelo: os radicais tresloucados do golpismo aventureiro nunca teriam se organizado da forma como o fizeram não fosse pelo apoio, direto e indireto, material e virtual, da oficialidade golpista, mas covarde, da corporação.
E nunca foi para implantar uma ditadura fascista; apenas para extrair vantagens puramente materiais do conjunto da sociedade brasileira em seu benefício.
Em síntese: o golpismo deveria ser civil, mas quem estava por trás da organização eram empresários manipulados e estimulados por altas patentes da corporação militar.
Estiveram "por una cabeza", como reza um famoso tango, mas apostaram no cavalo errado. Finalmente, o Cavalão dos tempos de academia militar era um pangaré tosco, desajeitado, bem mais para um burro xucro do que para um corcel de corrida.
Os milicos se estropiaram no aventureirismo golpista, e perderam o respeito da sociedade.
** Paulo Roberto de Almeida - Diplomata, catedrático, escritor, importante intelectual brasileiro
* Pintura de Edward Munch
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