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08/01/2024 00:00
O julgamento de Cupido
de Guillermo Piernes **
A Promotoria levantou milhares, milhões de dramas que aconteceram ao longo dos séculos por responsabilidade do réu, que sentado no banco tinha sido despojado do seu arco e flechas por razões de segurança. A Promotoria tinha apresentado o pedido, imediatamente aceito, perante o perigo de Cupido lançar suas flechas para os integrantes do Tribunal, que perante tanto amor perderiam o juízo, impossibilitando o seguimento do processo.
Suicídios por envenenamento de adolescentes, homicídios e feminicídios, tristezas incomensuráveis, famílias e reinados destruídos, todos em nome do amor, que impregnou sempre as pontas das flechas do acusado.
A Promotoria exigiu que o Tribunal ignorasse a aparência de inocente do acusado, com seus ares e olhos infantis, seu corpo macio, cabelos encaracolados. "O pior veneno", definiu a Promotoria sobre a substância transmitida pelas flechas do réu.
A Defesa rejeitou as acusações, explicando que o Mundo teria acabado sem o amor e que precisamente a ausência ou ação do réu era a que desatava guerras. "Quem ama de verdade nunca faria mal ao ser amado ou seres amados", afirmou.
No pronunciamento final, a Defesa listou milhões de exemplos de abnegação, sacrifícios de seres impulsados pelas flechadas de réu.
O Tribunal demorou em dar o seu veredicto. O réu escutou a sentencia olhando pela janela a rosa que se abria no jardim do Tribunal.
Foi a sentença mais dura aplicada na história do Tribunal, condena perpetua. Por toda a vida condenado a "amar e partir...amar e partir...amar e partir..."
** Guillermo Piernes - Jornalista, palestrante, escritor
Pintura de Cupido - Pinterest
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