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A liberdade ganhou uma - Roberto Garcia

29/06/2024 00:00




A liberdade ganhou uma 

de Roberto Garcia ** 

­Lembro as imagens do helicóptero sobrevoando uma vizinhança qualquer do Iraque. Os soldados americanos na porta, com suas metralhadoras, olhando lá embaixo. Num momento, começam a apontar e a atirar, contra as pessoas que passavam, indeterminadas. Elas levavam os tiros e caíam. Os que tentavam fugir também eram visados, também caíam.

O filme breve foi divulgado por uma organização da qual ninguém tinha ouvido falar. Era a Wikileaks. Nos meses seguintes, mais imagens, mais documentos supersecretos do Pentágono, do Departamento de Estado, dos órgãos de inteligência. Revelavam a manipulação, as traições, os crimes. Tanto dos próprios americanos quanto dos aliados, as vezes de gente insuspeita.

A batelada de documentos -- dezenas de milhares, passou de meio milhão -- deixou a nú, claras, as maldades do império. Não tinha como esconder, nem responder. A raiva cresceu nos gabinetes de Washington. Precisavam encontrar e punir.
Não demorou para que surgisse o principal responsável. Assange, um rapaz australiano, jornalista, editor. Para os deste lado, um santo. Para o outro, a personificação de Satanás, que não podia ser perdoado.

Começou assim a saga. Inventaram logo uma acusação. A ex-namorada, sueca, diz que tinha sido abusada por ele, razão para prende-lo, pedir sua extradição. Perseguido, Assange se asila na embaixada do Equador em Londres. Lá fica, meses, anos. O governo inglês, não podia ser outro, também inventa todas as ordens judiciais, quer extraí-lo da embaixada. A namorada retira a acusação, confessa que era mentira. O Equador tinha um desses raros governos que presta, resistiu. E Assange lá ficou. Envelheceu, os cabelos embranqueceram, não se deu por vencido. Ficou patente o amor inglês e americano pela liberdade de expressão. Pode falar o que quiser, desde que não revele os segredos dos crimes.

Formaram-se os grupos de defesa de Assange. Bastava não ser cego para perceber o caso. Há sempre os rapazinhos que defendem o império, em geral bem pagos, há também os que trabalham de graça. A maioria estava com o australiano, tinha adorado a exposição dos documentos.
Eram os tempos do presidente negro, que logo no início de seu mandato tinha recebido o prêmio Nobel da Paz. Esperava-se dele algo melhor. Mas ele era autoridade, tinha que defender o governo do império. A secretária de estado era a mulher do ex-presidente do Partido Democrata, a Hillary Clinton. Os documentos da Wikileaks mostraram as tramóias da Hillary, até então com boa fama. Provaram que ela não era nem melhor, em alguns casos pior, que todos os outros chefes da política internacional americana. Na campanha, logo a seguir, o Donald Trump, candidato republicano, sai-se com a frase famosa: Wikileaks, adoro a Wikileaks.

Mais embaraço para os democratas que, na maior parte das vezes são os que começam as guerras americanas.

O governo do Equador mudou. Entrou um vira-latas. Mandou tirar Assange da embaixada em Londres. O governo britânico o colocou na cadeia, com planos de extraditá-lo para os Estados Unidos, onde a raiva só se acumulava contra ele. Mas também se acumulava o embaraço diante de toda a comunidade internacional que ainda tem um pouco de vergonha.

Nove anos na embaixada, cinco na masmorra britânica. A campanha eleitoral nos Estados Unidos avança. Novamente, Trump está concorrendo. O caso Assange vai novamente gerar falação indesejável, já tem muitas, mais embaraço. Biden deve ter achado que já bastava. Mandou que fizessem um acordo. O australiano herói da liberdade topa se considerar culpado da liberação dos documentos secretos. O governo americano aplica uma sentença igual aos anos em que ele ficou preso. Vai ser liberado nas ilhas Marianas, no Pacífico, perto da terra dele.

Está para terminar. A liberdade ganhou mais uma. Mais vergonha para uma já desgastada terra de Tio Sam. Já chega a ser uma montanha, tipo Everest. Os que continuam achando que lá está um exemplo do paraíso vão passar uns dias de cabeça baixa. E nós vamos festejar. Viva Assange

** Roberto Garcia foi correspondente em Washington por vários anos de grandes veículos de imprensa. Artigo do seu FB
* Foto de Julián Assange - Agencia AP


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