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A Dama de Preto - Guillermo Piernes

06/01/2025 00:00




­A Dama de Preto

Guillermo Piernes **
 
Ele sabia que voltaria. Insistência e pontualidade sempre foram as suas características. Mas ele conhecia como enrolar um pouco essa dama, porém reconhecendo que ela gostava do jogo.

Tinham passado várias décadas dessa relação. Até não ficar velho, a sua relação com a Dama de Preto tinha sido casual, superficial, inconsciente. Depois tudo mudou.

Na barriga da mãe quando os médicos já consideraram sacrifica-lo para proteger a vida da genitora, reclamou. Quando a Dama apareceu ele berrou e ela entendeu como "quero nascer". E ele nasceu, quando todas justificativas científicas apoiariam a Dama de Preto no caso de levá-lo.

Viveu intensamente. Na infância desfrutando de todas as brincadeiras. Apanhou, caiu, sofreu arranhões sempre correndo atrás da diversão e das fantasias. A Dama de Preto não se atreveu a interromper esse ciclo ainda sabendo que alguns menos afortunados seriam levados por muito menos.
Mas a Dama de Preto gostava do moleque cheio de projetos, que a surpreendiam a cada visita. 

Assim ela nem ligou quando na adolescência o rapaz atlético foi operado para extrair amígdalas e teve uma hemorragia tão séria que acabou na UTI, onde os médicos quase decretaram o óbito. Ela abandonou a sala, com os médicos surpresos ao voltar o pulso do jovem inerte.

Quando ele serviu um ano como agente de polícia, para fugir do serviço militar obrigatório que o afastaria da universidade onde acabava de ingressar, ela também colaborou. Ao ser cercado por uma gangue violenta, em roupas de civil, conseguiu extrair a pistola e apontar exatamente o chefe da banda. Se viu perdido. Ele sabia que tinha tempo para apenas um tiro, mas o chefe da gangue recuou e assim fez o resto. A Dama de Preto a tudo assistiu, mas fechou os olhos para as possibilidades e deixou o local. 

Por amores entrou em brigas sérias. Pela profissão de jornalista esteve exposto a bombardeios, metralhas, ameaças,persecuções, em vários dos quarenta países onde fez coberturas, mas nada sofreu. Numa das suas centenas de viagens aéreas, a avioneta ao aterrizar numa clareira na Amazônia esteve a centímetros de bater contra uma árvore. Mas não aconteceu. Parecia que a Dama de Preto tinha uma deferência especial para o jovem destemido ou simplesmente maluco por viver com o acelerador a fundo.

Essa paixão pela intensidade o fez capotar numa estrada. O carro deu quatro voltas no ar antes de se espatifar no asfalto. Tudo ficou destruído menos o lugar do condutor, que saiu apenas com um golpe na coxa. A Dama de Preto, nesse episodio, optou para olhar as lindas flores a beira de estrada em vez de tomar as medidas apropriadas para realizar a sua função. 

Já com meio século de vida, numa visita ao cardiologista escutou que tinha que fazer exames profundos porque a taquicardia que aparecia de vez em quando indicava algo. Ele não tinha tempo para detalhes e seguiu com seus projetos que pareciam encantar a Dama de Preto.

Fez tudo que ditou seu coração ditador, seu minísculo juízo, sua insaciável sede por vivir cada emoção. Alguns golpes, uns poucos remorsos, mas  nesses anos a Dama de Preto parecia estar de ferias para ele. 

E num piscar de olhos chegou aos 70. A Dama de Preto passou a visita-lo com certa frequência. Ele começou a entender. Quando ele sentia a sua presencia, explicava seu projeto mais empolgante do momento. Buscava sempre executar seus projetos. E quando fracassava num projeto, em vez de lamentos lançava um novo. E a vida seguia, cada dia mais acelerada. Uma tarde sentiu uma opressão forte no peito. Lhe pareceu enxergar a Dama. Disse-lhe: "É justo você querer me levar, mas queria concretizar o projeto de visitar aos meus poucos amigos do peito que restaram.". A Dama pareceu concordar. Ele cumpriu com a palavra e conseguiu viajar e abraçar a esse pequeno grupo de amigos. 

E chegou o ano quando ele celebraria 80. A Dama de Preto ficou perto dele. Ele sentiu que lhe acompanhava quase diariamente, nas lembranças de pessoas, de lugares. Uma tarde falou bem alto para ela ouvir: "Sei que você acha que, agora sim, chegou a minha hora. Você está certa do ponto das estatísticas, mas deixa te explicar uma coisa... Estou escrevendo um conto realmente lindo sobre você. Me deixa acaba-lo?...

Vaidosa, ela aceitou...

(...O autor ainda está desenvolvendo o projeto para dar um bom final a este conto sobre a Dama de Preto. Aguardem confortavelmente sentados. Conto com vossa compreensão...)

** Guillermo Piernes é ou foi jornalista, diplomata, escritor 
*  Crédito imagem Anjo da Morte - Pinterest


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